Um Conto de Fábula

Cresci ouvindo as fábulas de La Fontaine e, de tanto ouvi-las, acreditei por um bom tempo em animais falantes. Confesso que, não raro, na minha infância, costumava fixar os olhos em cães e gatos, na esperança de ouvir deles algo como “bom dia” ou quiçá um “olá”, dito assim, com ar blasé.

Com o tempo, o máximo que ouvi foi um “desista”, pronunciado em tom de deboche por um papagaio que, se não fugisse, teria sido a sua última palavra em vida.

Para uma criança, animais que falam são tão comuns quanto bichos não falantes o são para os adultos. Com a vantagem de que os adultos que acreditaram na eloqüência dos animais se deram muito bem na vida, que o diga o próprio Fontaine ou Walt Disney, que deu asas à imaginação e fez camundongos, cães e gatos parecerem Camões.

Confesso que mesmo adulto —e em plena era da globalização— desconfio que os animais são exímios oradores. Pelo menos não me surpreenderia se, num desses encontros casuais, um deles soltasse um “fala, bicho” em linguagem jovial. Por via das dúvidas, já tenho preparado um “diga, animal” de resposta.

Recentemente, recebi um e-mail da Silvia Braune, amiga recém-chegada do Paraná, veterinária boa pra cachorro, como dizia os jovens nos tempos do meu pai, falando maravilhas do Cavalo Marinho, aquele animalzinho com ar delicado que habita as profundezas do mar sem fim.

Pois bem, ela reverenciava como o maior mérito dessa espécie o fato de os machos engravidarem e — acreditem!— darem à luz uma infinidade de Pocotozinhos do Mar.

Fico imaginando se essa moda pega na raça humana. De antemão já vou logo avisando que não pretendo ter filhos. Não é por medo das dores do parto. Mas acho uma injustiça para a mulher ter que sair em plena
madrugada à procura de algo como churrasquinho de búfalo albino do deserto friorento do Cazaquistão, para atender aos meus desejos de grávido.

O fato é que nada mais me espanta. Numa época em que homens têm assumido cada vez mais papéis de bichos — mulheres ficam uma arara, comilões têm fome canina, o frustrado dá com os burros n'água—, nada mais justo do que os bichos passarem a desempenhar funções humanas.

Aliás, animais também têm se revelado os acontecimento políticos que assolam o nosso País. Além de histórias cabeludas que fariam Lobisomem parecer ursinho de pelúcia, as personagens costumam estar metidas na lama feito porcos, normalmente por comportamento digno de burro. Todos muito falantes, destaque-se.

Nossa história parece mais uma grande fábula.

A diferença é que as fábulas têm sempre uma moral.

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    # by Yvette Maria Moura. - 9:05 AM

    Meu amor,
    Há quem diga que se faz maravilhas sob pressão...
    E eu tenho que admitir que sim.
    Amo você (também) pela capacidade que tem de transcender aos limites.
    Meu beijo*