Pingo nos is

Sabia no íntimo que era chover no molhado, mas todo ano ele esperava a chegada do inverno. O rádio ligado numa estação qualquer executava uma música quente, de vez em quando entrecortando-a com notícias frias. Alheio à enxurrada de informações, preferia acreditar que a chuva fazia brotar nele plantações inteiras de felicidade. Por isso sulcava, com a delicadeza de um cirurgião, as coronárias maltratadas pelas intepéries da vida, para ver brotar nelas as primeiras sementes de alegria. À Vera, prima, confessava que o melhor lugar para guardar a chuva é o coração, porque é a partir dele que o barulho das gotas caindo no chão se espalha e ajuda a irrigar a alma. Porque para algumas pessoas é assim: no inverno o sol brilha mais forte.