Saindo do Armário

Como cinéfilo incorrigível, costumo assistir a muitos filmes, incluindo os ruins. Porque, para quem gosta de cinema, o bom mesmo é assistir longa-metragem ruim, só para ser do contra. E melhor ainda é saber que tem gente que, por pior que seja a fita, sai do cinema maravilhado.

Quando se trata de cinema de terror – onde a lista de lixo é tamanha que não há companhia de limpeza que dê jeito – isso é facilmente perceptível. Mas nesse ponto eu concordo: nessa categoria, o que é ruim fica delicioso, se você observar sob determinada ótica. Porque o filme mal feito passa a fazer você rir em vez de se assustar. Só não entendi ainda porque se paga para ter medo (principalmente quando há tantos cemitérios mal iluminados e gratuitos por aí).

Dia desses, fui ver "O Pesadelo", filme que tem todos os clichês do gênero. A obra (vou ser generoso a chamando assim) conta a história de um rapaz que passa o tempo inteiro atormentado por um pesadelo que o acompanhava desde a infância, em que um monstro saía do armário (acho que o monstro era gay que resolveu se assumir) e resolve atormentar a pobre alma.

Enquanto a história comia no centro, eu não parava de me lembrar da minha gaveta. Não sei se isso acontece com todos, mas não consigo encontrar nada que guardo na gaveta. É um terror. Tenho a impressão que ela é que nem o meu talão de cheques: sem fundos.

O pior é quando resolvo procurar determinada coisa. Encontro tudo, menos o que procuro. Tinha uma empregada que vendo meu drama, mandava eu apelar para São Longuinho, numa simpatia ridícula que incluía até uns pulinhos. Não é duvidando do poder de tal santo não (que deve ser um cara muito alto, pelo nome), mas não me acho dando pulos por aí para que as coisas apareçam. São Longuinho deve funcionar muito bem com os mágicos, que precisam fazer com que objetos desapareçam e apareçam como num passe de mágica. Comigo não. Para mim, ele está no mesmo patamar de São Nunca (acho até que são irmãos).

Mas esta crônica era para ser uma história de terror. Mais: uma história de terror que aconteceria dentro de uma gaveta onde tudo desaparece. Às vezes tenho a impressão de que a qualquer momento um monstro emergirá dela. Falo de monstro sobrenatural, porque dela já surgem cada monstruosidade de dá dor, disfarçada em contas a pagar. Essas eu queria que desaparecessem, mas cadê que São Longuinho faz um milagre às avessas?

Vez por outra, tento fazer uma limpeza na gaveta, jogando fora o supérfluo. Mas não sei como, dois dias depois, ela já está abarrotada de trecos outra vez. E de novo impossível de se encontrar algo nela. Outro dia sonhei que a jogava fora. Porém ela sempre retornava ao mesmo lugar, intacta... e abarrotada, numa insistência que mais parecia um pesadelo. Ou melhor: um filme de terror ruim.