Felis silvestris catus por Lepus
O homem levou séculos até conseguir domesticar os animais. Começou ainda na Pré-História e se estendeu por outras eras. Confesso que ainda hoje tenho dúvidas se ele obteve êxito em seu intento, inclusive com os animais que julga ter domesticado. Tenho convicção disso cada vez que observo o comportamento de um gato. Ninguém me tira da cabeça que aquele ar esnobe esconde um plano para dominar o mundo. Para mim, o processo foi justamente inverso: o gato quem domesticou o homem. E não é de hoje. Já na antiguidade, os egípcios o veneravam como um deus. E você achando que o não-me-toques do animal havia surgido do nada! Ledo engano. Na verdade, acredito que quem possui um desses animais achando ter o domínio sobre ele, comprou literalmente gato por lebre. Ou, numa linguagem mais culta, felis silvestris catus por lepus. A prova cabal de que os felinos estão dominando os seres humanos me veio por telefone, no exato momento em que assistia à Mulher Gato – alter ego de Selina Kyle, criada nos anos 1940 por Bob Kane. Reconheci a voz do Márcio no outro lado da linha. Desconheci, no entanto, o motivo do telefonema.
- Quero lhe convidar para o aniversário da Docinho – sapecou, com voz de timidez.
- Quem diabos é Docinho? – quis saber.
- A gata da Nicole...
Ele deve ter ficado constrangido com a minha gargalhada. Mas depois de dez minutos tentando me refazer da crise de riso, consegui dizer sim ao convite. Verdade que fiquei com uma pulga atrás da orelha, imaginando que aquilo tudo não passava de um trote. Pensei na figura séria do meu amigo – exemplo de sobriedade entre os seus – tentando se controlar para convidar meio mundo de gente para o aniversário de uma gata que tinha nome de menina. Superpoderosa, ainda por cima.
- Vai ter água-que-passarinho-não-bebe – tentou me convencer para ir à festa.
- E a Docinho gosta de quê? – quis saber, tentando imaginar que presente eu daria a uma gata com nome açucarado.
- Comer e dormir – respondeu ele.
Não fosse a minha filha, ainda hoje estaria tentando encontrar presente para a gata. E mesmo com a ajuda da Isa, comprei a lembrança para a Menina Superpoderosa errada. Ou seja: gata e desenho animado não são, definitivamente, o meu forte. Mesmo assim fui ao aniversário. Quem sabe no futuro eu não mereceria uma citação numa nova adaptação da história de Charles Perrault. Com ou sem botas. Ou quiçá um lembrete em O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá. Por isso fiz o sacrifício de tomar a tal água-que-passarinho-não-bebe num copo da Barbie.
Esnobe, a Docinho se recolheu, deixando um monte de marmanjo com língua de sogra na boca e cantando Parabéns pra Você em plena sala, enquanto ela olhava de soslaio à guisa de deusa, achando que falta muito pouco – mas muito pouco mesmo – para sermos domesticados.
- Quero lhe convidar para o aniversário da Docinho – sapecou, com voz de timidez.
- Quem diabos é Docinho? – quis saber.
- A gata da Nicole...
Ele deve ter ficado constrangido com a minha gargalhada. Mas depois de dez minutos tentando me refazer da crise de riso, consegui dizer sim ao convite. Verdade que fiquei com uma pulga atrás da orelha, imaginando que aquilo tudo não passava de um trote. Pensei na figura séria do meu amigo – exemplo de sobriedade entre os seus – tentando se controlar para convidar meio mundo de gente para o aniversário de uma gata que tinha nome de menina. Superpoderosa, ainda por cima.
- Vai ter água-que-passarinho-não-bebe – tentou me convencer para ir à festa.
- E a Docinho gosta de quê? – quis saber, tentando imaginar que presente eu daria a uma gata com nome açucarado.
- Comer e dormir – respondeu ele.
Não fosse a minha filha, ainda hoje estaria tentando encontrar presente para a gata. E mesmo com a ajuda da Isa, comprei a lembrança para a Menina Superpoderosa errada. Ou seja: gata e desenho animado não são, definitivamente, o meu forte. Mesmo assim fui ao aniversário. Quem sabe no futuro eu não mereceria uma citação numa nova adaptação da história de Charles Perrault. Com ou sem botas. Ou quiçá um lembrete em O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá. Por isso fiz o sacrifício de tomar a tal água-que-passarinho-não-bebe num copo da Barbie.
Esnobe, a Docinho se recolheu, deixando um monte de marmanjo com língua de sogra na boca e cantando Parabéns pra Você em plena sala, enquanto ela olhava de soslaio à guisa de deusa, achando que falta muito pouco – mas muito pouco mesmo – para sermos domesticados.
This entry was posted on 6 de outubro de 2006 at 7:57 PM. You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. You can leave a response.
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