Nossos ídolos ainda são os mesmos?

“Todo en la vida es a perder o ganar
Hay que apostar, hay que apostar sin miedo”


No próximo mês, a minha filha fará onze anos. Aos poucos, o ar de criança vai dando lugar aos traços de mocinha, gerando os conflitos naturais da transição. Onze anos. Ainda há pouco, lembrava-me dos seus ídolos, me dando conta de como eles foram pontuando cada fase de sua vida. Primeiro, a Branca de Neve, a quem ela – ainda mal concatenando palavras – chamava de Diné. Fase boa, aquela. Época em que eu me vestia de Príncipe Encantado e ia à sua escola, contar história para seus coleguinhas de turma. E ela, toda envaidecida, fingia ser a personagem principal do conto de fadas, com direito a comer a “maçã envenenada” e ganhar um beijo do príncipe – naquela época inocente, eu. Alguns anos mais tarde, os desenhos animados dariam lugar a ídolos de carne e osso, como o grupo mexicano RBD, de quem ela cantava as músicas, num espanhol infantil e por sê-lo, mágico:


Y soy rebelde
Cuando no sigo a los demás
Y soy rebelde
Cuando te quiero hasta rabiar

Era uma rebeldia inexistente aquela em que ela imitava a Anahí, Dulce Maria, Christian Chávez, Alfonso Herrera, Maite Perroni e Christopher – sim, eu “fui obrigado” a decorar o nome dos Rebeldes. E os mantive sempre na memória até que ela os trocou – já na nova fase – pela Isa TKM. Coisa de menina, não precisei me preocupar muito com nomes, personagens, músicas etc. Mas comecei a perceber que os heróis de minha filha estavam crescendo, acompanhando-a na sua passagem inexorável do tempo. E fui percebendo as sutilezas de seus pequenos conflitos entre ser criança e já parecer mocinha. Outro dia, por exemplo, ela se esqueceu de levar seu perfume para minha casa. “Não se preocupe, meu amor, tem um seu guardado aqui”, tentei remediar. “Ah, pai, não gosto mais dele. Tem cheiro de bebê”, disse. “Vou usar o seu, para ficar com seu cheiro, que eu amo”, emendou. E eu me lembrei da época em que eu me vestia de príncipe – fase que já foi esquecida por ela, como também foi a Isa TKM. Agora, seu ídolo é o Justin Bieber, como o é para milhões de crianças e adolescentes em todo o mundo. Recentemente, vi reportagens sobre a turnê do astro adolescente no Brasil e vi milhares de Isa chorando com a possibilidade de assistir ao show do cantor. No dia que anunciaram a venda de ingressos para a apresentação do cantor canadense, acompanhei, via MSN do trabalho, sua saga de tentar reservar as entradas. Por várias horas, ela ficou apertando o F5 do teclado, na esperança de ver surgir na tela o sinal positivo para a compra. Não deu certo. Já passavam das duas da manhã quando ela foi dormir, frustrada. E ficou mais ainda quando soube que não poderia ir ao show, por falta de grana. Mas, compreensiva que é, encontrou outra forma de acompanhar o seu astro – seja lendo as notícias sobre os shows no Brasil, seja encontrando vídeos na internet sobre ele. Falou tanto sobre os shows do cantor que outro dia acabei sonhando que a levava para ver a apresentação. Sem muito dinheiro – algo recorrente que me acompanha até nos sonhos – sonhei que tinha comprado entradas em local não muito favorável – eram as mais baratas. Mesmo assim, ela não reclamou, afinal, era o Justin Bieber! Percebi, no entanto, que a Pista Prêmio estava vazia. E tive a ideia de tentar entrar com ela naquele local. Fomos até a entrada, eu segurando minha filha pela mão. Mas fomos barrados pelo segurança, que exigiu os bilhetes de acesso. “Eu vou entrar, porque o sonho é meu. Quando você puder sonhar, você me barra, ok?”, eu quis dizer isso, mas não consegui articular a fala, no sonho. Não sei como, mas o fato é que entramos e fomos direto para frente do palco. Ela, empolgadíssima; eu, feliz por ela. Quando o Justin Bieber começou a cantar, os olhinhos de holofotes dela não se desviaram do cantor adolescente um só segundo. A certa altura, o cantor desceu do palco e eu – sem saber o motivo – deixei a Isa para trás e fui o seguindo, até que ele parou diante de mim, me cumprimentou com um aperto de mão e perguntou: “Cadê a Isa?”. Eu não acreditei que o Justin Bieber – que tinha levado mais de 60 mil adolescentes àquele estádio – sem contar os milhares de pais que ficaram à porta ansiosos para que o show terminasse – estava perguntando pela minha filha. E em bom português – coisa de sonho, vá lá. Ainda segurando sua mão, saí rasgando a multidão até onde estava a minha filha, como quem levava um herói para salvar o mundo. Fui encontrá-la ao pé do palco, sentada com algumas amigas. Alegre como quem tinha ganhado na loteria, eu lhe mostrei o cantor: “Isa, olha quem está aqui!”, disse, eufórico. Ela olhou para mim, estendeu a mão como quem me mandasse parar e disse: “Espera, pai, que eu brincando”.