Dia Internacional do Homem

E porque, no dia Internacional da Mulher, há uma série de homenagens àquelas que são, definitivamente, a razão da existência do homem sobre a Terra, ele decidiu que no Dia Internacional do Homem iria comemorar em dobro. Antes de se levantar da cama, repassou na mente todos os símbolos do macho e pensou em ter um dia de rei. Foi ao banheiro e urinou sem levantar a tampa do vaso, tomou banho e saiu do boxe sem se enxugar, molhando tudo em sua volta, e aproveitou para deixar a toalha molhada sobre a cama, ao lado da companheira que ainda dormia. Já passavam das oito quando foi tomar o café da manhã, ainda de cuecas. Depois da primeira garfada fez questão de arrotar e ficou imaginando que se naquele momento, todos os homens do mundo tivessem arrotado, o Dia Internacional do Homem seria o responsável pelo aumento significativo no buraco da camada de ozônio. "E daí?", pensou. O dia não era para se sentir culpado e por isso continuou comendo como um cavalo. Vestiu-se apressado e saiu de casa com a certeza de que nada, naquele dia, o tiraria do sério. E não o tirou. O resto do dia transcorreu normalmente. Até as habituais cantadas na secretária foram mantidas, para não perder a prática. "Se alguém tivesse que perder o hábito, que fosse alguma freira insatisfeita", pensou.
- Dona Matilde, hoje quero brindar com a senhora. Traga-me a meia-taça?
- De qual champanhe? - quis saber a moça.
- E quem falou em champanhe, dona Matilde? Me refiro ao sutiã...
Disse isso e foi para a sua sala, sem notar o constrangimento da mulher, que sequer usava sutiã. Mal entrou no escritório e soltou um grito surdo.
- Dona Matilde, quem colocou essas flores aqui?
- Mas hoje é o Dia Internacional do Hom...
- E quem foi que disse que homem gosta de flor, dona Matilde?
Ia dizer que macho que é macho, em qualquer dia do ano, não perde tempo admirando flores, mas percebeu a tristeza no olhar da secretária e se conteve. Ainda abriu a boca pra falar que o verdadeiro homem tem alergia ao cheiro de flor, mas se calou porque pensou que alergia fosse algum tipo de frescura. E frescura, definitivamente, não fazia parte da vida de um homem. Decidiu que o episódio não o faria perder o dia — internacional, diga-se de passagem. Preferiu ficar sentado, tirando meleca do nariz com uma mão e segurando a Playboy com a outra. Ainda estava absorto nos benefícios do silicone sobre o corpo feminino quando o telefone tocou. Eram os amigos — outros exemplares nada exemplares de homem — que lhe convidavam para tomar uma cerveja, depois do expediente, na Toca da Val, um frege-moscas sem nenhuma reputação freqüentado por homens sem reputação nenhuma. Recusou o convite alegando que tinha combinado com o filho de sete anos — que iria comemorar o Dia Internacional do Homenzinho à sua maneira — de assistirem juntos ao jogo do Mengão. Além disso, precisava ensinar, desde cedo, os bons modos ao pimpolho. Chegou em casa, deitou no sofá, tirou os sapatos — que fez questão de jogar em lugares separados — e puxou as meias, cheirando ambas antes de fazer uma bola e tentar acertar o abajur. Antes de ir pro banheiro, fez questão de dar ordens para que ninguém mudasse de canal. Na dúvida que alguém acataria seu pedido, levou o controle remoto consigo. Queria manter tudo sob controle. Quando saiu, o filho já o esperava trajando o uniforme do Flamengo. Vestido de pijama — dois números menores, o que acentuava sua barriga de chope — se esparramou no sofá, com a cerveja numa mão e o controle na outra. Antes do jogo começar, tentou explicar para o filho o que era o Dia Internacional do Homem. Fez questão de destacar o Internacional e explicou que não tinha nada a ver com o time do Rio Grande do Sul que iria enfrentar o Flamengo, em alguns instantes. Ficaram vendo o jogo por pouco tempo porque, cansado do dia enfadonho que teve, nem viu o Internacional meter uma goleada no seu time. A mulher, que detestava futebol, só apareceu na sala para apanhar o filho que dormia sobre a barriga mole do pai. E vendo o marido naquele estado, ficou imaginando a insignificância que é o Dia Internacional do Homem.