A Propaganda de Saia
Se lhe pedissem para citar um nome da publicidade brasileira provavelmente você falaria Nizan Guanaes, Washington Olivetto ou outra figurinha carimbada, certo? Natural, uma vez que esses profissionais são considerados papas da propaganda em nosso País. O que muitos esquecem – ou nem se lembram – é que foi graças a uma mulher que a nossa publicidade foi inventada. Estávamos no início do século XIX, o Rio de Janeiro era o berço do Império e o centro cultural do País. Sem Flamengo, Vasco ou Fluminense para torcer – nem indícios de bala perdida – o carioca preferia passar as horas comentando as últimas notícias da corte, quem sabe à procura de alguma fofoca real. O surgimento da imprensa facilitaria esse processo e seria, alguns anos depois, o canal para a veiculação do primeiro anúncio, que surgiria na Gazeta do Rio de Janeiro, em 1808. Entre notícias variadas, lá estava ele, impetuoso: “Quem quiser comprar uma morada de casas de sobrado, com frente para Santa Rita, fale com Ana Joaquina da Silva, que mora nas mesmas casas, ou com o capitão Francisco Pereira de Mesquita, que tem ordem para as vender”. Sem perceber, Ana Joaquina foi a responsável não apenas pelo início da propaganda brasileira, mas por instituir o mau-humor na nossa publicidade. Foi graças a ela que se descobriu que o mau-humor não era a melhor ferramenta para vender anúncios. Se fosse seguir a tendência, provavelmente Washington Olivetto não teria criado, muitos anos depois, o Garoto Bom Bril – o mais duradouro personagem de toda a história da propaganda nacional –, famoso por seus tipos e textos cômicos. Dá para imaginar o Carlos Moreno sério, com uma esponja de aço na mão e um texto sóbrio na ponta da língua? “Quem quiser limpar suas panelas pode falar com a Bom Bril ou vá a algum supermercado que tem ordem para a vender”. Não tenho notícias se dona Ana Joaquina conseguiu vender as casas. Mas me lembro dela sempre que vejo os anúncios dos classificados dos jornais. Para mim, dona Ana deveria ser elevada à categoria de padroeira da publicidade popular, aquela que não tem pretensão nenhuma, nem mesmo de vender o produto. Certo que a publicidade brasileira evoluiu a anos-luz do que era na época de dona Joaquina, mas os classificados dos jornais continuam com o mesmo DNA dos primórdios. Tomando emprestada a teoria de Darwin, é o primata que não se transformou em homem. Duvida? Veja os anúncios de emprego, por exemplo: “precisa-se de empregada doméstica que durma no emprego” ou “quero trabalhar como empregada. Durmo no emprego”. Sempre questionei esse tipo de anúncio. Ninguém quer alguém que durma no emprego, mas, no máximo, que durma no local onde trabalha. Depois do expediente, claro.A gente só percebe o duplo sentido dos anúncios de emprego quando chega em casa, em pleno dia, e descobre a empregada dormindo, quando deveria estar trabalhando. Nessas horas, invariavelmente eu me lembro da dona Ana Joaquina, com seu senso de humor impecável, e vejo como a publicidade evoluiu.
This entry was posted on 12 de julho de 2005 at 11:52 AM. You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. You can leave a response.
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