Com Açúcar e com Afeto

Confesso que não sou um dono de casa a contento, culpa do ritmo acelerado de trabalho que me faz passar o dia todo fora. Embora seja muito caseiro — na maioria das vezes prefiro ficar diante da tevê a ter que ir à praia —, tenho tratado com descaso o meu “home, sweet home”.

Para me redimir da culpa, de uns dias para cá passei a ficar antenado à pequenas coisas do lar. Um conserto aqui, outro acolá — coisa pouca, é verdade, mas estava até me divertindo. Até me deparar com elas, aos milhares, por toda a casa, impávidas como se fossem as próprias donas.

Não tenho nada contra as formigas, desde que elas se mantenham em seus formigueiros. Para mim, são seres minúsculos —no sentido de importância, e não de tamanho — e nem mesmo a Formiga Atômica me despertava interesse quando criança. Por isso não contei história e tratei logo de providenciar veneno contra a praga.

— Tem veneno para matar formiga?

— tratei logo de perguntar ao vendedor.

— Que tipo de formiga?

— Invasoras.

— Falo de espécie...

— Salvo a Saúva, não conheço outro tipo de formiga.

— Há dezenas delas — atalhou logo o vendedor, mais interessado em vender do que nas famílias dos insetos.

— As que habitam em casa.

— Ih, mais complicado ainda. Tem vários tipos.

— Ah, me dá aí qualquer veneno. Elas não vão saber mesmo!

Alguns minutos depois, estava eu preparando o veneno, “destinado a acabar com as formigas açucareiras” como informava o rótulo do produto. Pensei que tivesse algo a ver com as formigas que infestavam o meu lar, doce lar, comendo paredes, chão e tudo o mais que encontravam pela frente.

Funcionar, não funcionou. Pelo menos como deveria. Alguns dias depois de ter espalhado o veneno pelos quatro cantos da casa, as formiguinhas continuavam lá, passando ao largo, como se estivessem esnobando o produto. Além disso, apareceram outras centenas de formigas, especialmente para provar do veneno.

Descobri que estas, sim, eram as tais “açucareiras”. Agora tenho duas espécies de formigas habitando a minha casa. E todas vivinhas da silva, alimentando-se do meu próprio veneno.