Uma outra estação


Eu já trabalhava com Jornalismo quando os músicos da Legião Urbana entraram em estúdio para gravar um novo disco. A ideia da banda era que “A Tempestade” fosse duplo. Havia material para isso, alegavam. E eles tinham pressa. Sabiam que o poeta não permaneceria entre eles por muito tempo, essas coisas que acontecem na vida da gente e que não há explicação. (E quem disse que poeta precisa dar explicação?) O rigor do destino forçou a banda a laçar um CD simples, descartando boa parte do material que já havia sido gravado. Um ano depois, com a morte de seu líder, a Legião lançaria “Uma Outra Estação”, com as gravações originariamente pensadas para o disco anterior. Todas as canções contam com os vocais de Renato Russo. A exceção é “Sagrado Coração”, cuja letra presente no encarte do disco não foi interpretada pelo poeta. Não havia mais tempo, a canção foi lançada apenas com instrumentais. Por muito tempo, ela permaneceu no MP3 que eu carregava durante as minhas caminhadas matinais na orla de Maceió. Depois de percorrer alguns quilômetros das praias mais bonitas do Brasil – permitam-me ser bairrista, porque esse sentimento em mim é que nem maré –, sentava-me na areia da enseada da Pajuçara e ficava olhando as jangadas levando os turistas para as piscinas naturais, costurando o mar com linha do horizonte. Nesse momento, aumentava o volume de “Sagrado Coração” e ficava admirando o bailado das embarcações. E imaginando a letra inexistente da canção: “E me disseram:/ Este lugar pode estar sempre ao seu lado/ E a alegria dentro de você/ Porque sua vida é luz...”.
Que seja assim.