Diário de borda em... Procura-se

Sou o redator que você procura –, eu disse, apontando para o cartaz na parede da agência, onde se lia “Procura-se Redator. Vivo ou morto”. – Infelizmente, estou quase na segunda opção – completei. – Vivo matando cachorro a grifo para não morrer. Culpa de quem disse que uma imagem vale mais do que mil palavras. Queria ouvi-lo dizer isso usando imagem, em vez de palavras. Se você souber onde ele mora, por favor me avise. Quero lhe enviar uma fotografia do Aurélio de presente, para deixá-lo sem fala.
Por trás da mesa, o dono da agência apenas ouvia, louco para substituir as mil palavras do outro por uma simples fotografia. Podia ser em preto e branco, para economizar cores. Mas eu, pretendente ao cargo, continuei:
– Quando mais jovem, uma cigana leu na minha mão que eu iria me dar bem com as letras. Por um momento, pensei que fossem as Letras do Tesouro. Estou até hoje procurando o mapa da mina. E só caio na real quando me vejo sem um centavo de real nos bolsos. Por isso ando meio em itálico, assim, pendido pro lado. Antigamente, vivia em negrito, robusto, mas a situação exigiu um plano B e hoje tive que afinar. A sorte é que ainda tenho um alfabeto inteiro para usar como plano. Sou jornalista por formação. Há mais de 15 anos vendo o meu peixe diariamente. Eu e o seu Francisco, que usa o jornal em que escrevo para embrulhar o pescado no dia seguinte. Os clientes dele não têm do que reclamar. Conseguem ler notícias fresquinhas de graça. Só não posso dizer o mesmo do peixe que seu Francisco vende, que exala mau cheiro. Ele diz que é culpa dos crimes que o meu jornal estampa. Eu não duvido. É bem provável que eu já esteja morto no momento em que você decida me contratar. Por via das dúvidas, vou me identificar logo como ghost writer – em itálico, porque é assim que ando, meio pendido pro lado. Se você é daqueles que acreditam que a propaganda é alma do negócio, contrate-me como redator fantasma. Porque em publicidade, o que assusta mesmo é texto ruim. Dou a minha palavra. Minto. Negocio-a.